“A simplicidade é o último grau da sofisticação.”
Leonardo da Vinci
Minimalismo é aquela palavrinha da moda que todo mundo adora jogar na roda como se fosse a chave para uma vida iluminada, sem estresse e com closet de Pinterest. Não é bem assim. Quando ouvi a respeito pela primeira vez, sabia que se tratava de um princípio de design que favorece uma composição limpa em vez de decoração excessiva. O famoso “menos é mais”. Embora a frase tenha sido cunhada pela primeira vez na década de 1960 pelo artista americano Ad Reinhardt, foi o arquiteto alemão Mies Van der Rohe que a popularizou, criando um movimento artístico que sobreviveu até os dias atuais como um estilo de vida que propõe uma outra visão de mundo.
Na última década, o minimalismo transcendeu o universo da arquitetura. Numa sociedade cada vez mais dominada por excessos e desordem, este movimento surge como uma filosofia de vida focada em viver de forma simples e intencional para alcançar a “felicidade”. Todos esses conceitos têm uma crença fundamental em comum: reagem contra excessos desnecessários.
O designer, escritor e palestrante americano Graham Hill reflete sobre isso em uma de suas TED Talks: “Nós nos tornamos tão consumistas que precisamos de mais e mais espaço, o que também nos faz incorrer em dívidas enormes e gerar enormes pegadas ambientais . No entanto, nossos níveis de felicidade permanecem os mesmos de 50 anos atrás”.
Hill sugere eliminar todas aquelas coisas que nunca usamos – e pensar antes de comprar. Ele propõe uma fórmula de três etapas que chama de “vida editada”: 1. elimine implacavelmente; 2. pense pequeno, pequeno é sexy e 3. o que quer que você tenha, torne-o funcional. Não basta focar em posses ou apenas se livrar delas. A essência está na escolha consciente de viver com menos e priorizar coisas que realmente agregam valor.
Classificar objetos materiais é parte fundamental do processo, mas nossa bagagem emocional é igualmente importante a se considerar. Não se trata de ficar com o armário parecendo cenário de loja da Oscar Freire. É sobre liberar espaço, sim, mas principalmente mental, tirar a mochila pesada das costas. E, claro, fazer isso com o mínimo de drama possível, porque a gente já passou da fase de perder a calma por causa de uma estante bagunçada, seja no roupeiro ou na vida.
A arte de (não) acumular
Adotar o minimalismo é uma forma de se libertar do peso que acumulamos ao longo do tempo. Repito, não estou falando só dos objetos — embora, convenhamos, ter vinte canecas de café e usar sempre as mesmas duas já seja motivo suficiente para refletir. Estou me referindo ao peso das lembranças inúteis, das expectativas que já nem fazem mais sentido, e daquela lista de tarefas que a gente organiza só para sentir que está “em dia com a vida” – que nunca estamos.
A grande sacada é simplificar sem perder o prazer. Desovar o closet pode ser um exercício quase espiritual. Você olha para aquela blusa brilhante com ombreiras e pensa: “Como é que eu cogitei usar isso algum dia?” E então vem a sensação libertadora de dar embora, a leveza que o desapego proporciona.
Mas sem exageros. Não sou defensora de viver com uma única caneta ou contar as roupas no cabide com régua. Com tantos pertences inúteis, o essencial se perde e a desordem sufoca. O segredo está em “filtrar o que realmente faz diferença e nos traz alegria”, como ensina Marie Kondo, que ao lado de Joshua Fields Millburn e Ryan Nicodemus, contribuiram para popularizar o conceito de minimalismo. Assim como Hill, eles encorajam indivíduos a se livrar de itens que não servem mais e a buscar uma vida simplificada.
Minimalismo para além das coisas
E a bagunça na mente? Essa é pior que o armário. Uma vez que você começou a organizar as coisas físicas, o próximo passo é se livrar do excesso mental: preocupações, cobranças, autossabotagem, aquela vontade de controlar o futuro que só nos traz rugas. Não dá para reduzir a vida ao essencial sem fazer o mesmo com os pensamentos.
Em certo momento, já me senti mentalmente desorganizada e sobrecarregada. Confesso que organizar a paisagem interna foi, para mim, um processo mais lento. Costumava acumular preocupações como se fossem souvenires de viagem: “E se isso acontecer?”, “E se aquilo der errado”? A busca pelo minimalismo emocional teve valor significativo para me ajudar a acalmar o ruído interior e deixar de lado o que não servia mais. Porque a verdade é que a vida segue com ou sem os nossos planos impecáveis.
Portanto, respire fundo, desanuvie a mente e tente focar nos pensamentos que realmente importam — e sobre os quais temos algum controle.
Como fazer isso sem perder a diversão?
Aqui vai uma dica: não leve tão a sério. Minimalismo não é uma maratona de “ser a melhor pessoa zen”. É sobre entender que menos é mais, mas sem transformar isso numa nova obsessão. Se você quiser guardar aquela coleção de imãs de geladeira dos lugares que visitou, vá em frente. O que não dá é continuar guardando os boletos de 2014 “para o caso de algum dia precisar”.
Lembre-se que adotar o minimalismo é uma jornada pessoal, não tem receita única. Comece avaliando sua escala de valores, o que lhe traz satisfação e crie espaço para isso. E não estou falando do armário, mas da vida. Quanto mais acumulamos, mais difícil perceber as nossas reais necessidades e o que vale a pena manter. Ao eliminar excessos, encontramos mais propósito no que resta.
Livrar-se das tralhas pode ser exaustivo se lidarmos com tudo de supetão. Comece devagar. Uma gaveta, uma estante, um pensamento de cada vez. As coisas vão ficando mais leves, a casa mais arrumada, e você vai descobrir que o minimalismo tem a ver com qualidade e não quantidade. Vida simples não é sobre privação, mas sobre clareza e propósito.
A melhor parte? Sobra mais tempo para fazer o que realmente importa: levar a vida com leveza e de vez em quando, durante aquela viagem maravilhosa, comprar mais uma caneca de café.
6 Comentários
Adorei o texto e a colocação do minimalismo artístico, arquitetural e pessoal. O mais difícil acho q é o minimalismo da mente: jogar fora pensamentos excessivos, que nada adicionam a não ser stress Parabéns !
Perfeito. Amei o texto as dicas . 🥰
Texto de alta sensibilidade e cultura, delicadeza e bom senso. Dá uma leveza na alma só de ler, parece que o ar chega nos pulmões mais devagar…a Sí tem esse poder. A faxina dos pensamentos é a mais importante, escolher o que pensar, reduzir o pensamento e desacelerar… mas para isso o ambiente contribui muito! Lindo! Parabéns!
A pleasure to read, as always! Well composed with value for the reader. Sharing wisdom earned with grace and humor, Si has a knack for serving up doses of culture and wit. Congratulations!
Simone sempre certeira. Acredito que o minimalismo na mente é muito mais importante que o número de canecas que temos e, ao mesmo tempo, muito mais difícil do que se desfazer das ditas canecas…risoss Mas, concordo que se faz necessário livrar-se dos pesos, dos se, do passado, e também de alguns físicos. Que podem ser canecas, vestidos ou qualquer outra coisa que tenhamos em demasia e esteja ocupando espaço. Excelente pauta.
Oi, Si. Gosto muito dos conceitos e de aprender sobre minimalismo, organização, formas de simplificar a vida, em todos os sentidos: pessoal, profissional, sentimentos, finanças, tudo. Faço limpas em ‘amigos’ de redes sociais, faço limpas na gaveta de utensílios de cozinha, tenho separado para doar uma ou outra peça de roupa. Troco coisas de lugar para tornar mais funcional. Tudo sem pressa, sem pressão, do meu jeito. Vou enxergando melhorias no que faço e vou atacando aqui e ali, sem regras vindas dos outros, com propósito para minha vida. Amei seu texto. Beijo.