Em setembro de 2000, por iniciativa do secretário-geral da ONU, Kofi Anan, foi criada uma força tarefa envolvendo organizações como o FMI, a OCDE e o Banco Mundial, com o objetivo de ajudar a resolver pragmaticamente uma série de problemas de países pobres e em desenvolvimento. A iniciativa foi chamada de Metas de Desenvolvimento do Milênio (MDG, Millenium Development Goals) e visou um plano de ação em torno de metas para redução de pobreza, fome, doenças, para garantir acesso à água potável e colocar todas as crianças, meninos e meninas, na escola. A escolha dos setores a serem atacados pela força tarefa eram praticamente uma unanimidade entre mais de cem chefes de estado que se reuniram em Nova Iorque no United Nations Millenium Summit, o que resultou em um plano enxuto e bem focado, envolvendo oito objetivos e dezoitos metas específicas. As metas deveriam ser alcançadas em 2015 e, a despeito de dezenas de bilhões de dólares que foram gastos por governos, instituições internacionais e organizações privadas, isto não ocorreu, embora um grande progresso tenha sido alcançado, melhorando a vida de milhões de pessoas.
Em 2015 a ONU decidiu renovar o projeto por causa de seu sucesso parcial e criou as Metas de Desenvolvimento Sustentável (SDG, Sustainable Development Goals) para serem alcançadas em 2030. Por conta de uma participação maior de organizações, instituições e doadores, o programa se expandiu fortemente passando para dezessete objetivos e cento e sessenta e nove metas específicas. O problema é que a lista se tornou excessivamente longa, o que impossibilitou o alcance das metas e gerou pouco progresso. Várias metas prometidas não tinham nenhuma indicação de como alcançá-las e financiá-las, outras não deixavam claro o que se queria. Programas excessivamente longos perdem foco e eficiência. Outro problema é que recursos são escassos e não há o suficiente para resolver todos os problemas, de sorte que é necessário saber estabelecer prioridades.
Em seu novo livro, o renomado escritor e presidente do think tank Copenhagen Consensus Center, Bjorn Lomborg, sistematiza as contribuições de mais de uma centena dos melhores economistas do planeta, incluindo alguns prêmios Nobel, para selecionar um grupo menor de temas a serem atacados, usando como base a análise de custo-benefício[1].
Na análise custo-benefício (CB) aplicada às metas de desenvolvimento sustentável, buscam-se selecionar os alvos de acordo com o tamanho do benefício gerado por Real ou dólar investido. Trata-se de uma abordagem bastante criteriosa e técnica que elenca prioridades de acordo com o maior benefício esperado, visto que, na presença de recursos financeiros escassos, não há como realizar todos os objetivos desejados. Nem todas as políticas são igualmente boas, algumas têm um custo baixo e geram benefícios elevados, enquanto outras têm custos elevados e geram benefícios mais baixos.
A equipe começou analisando quase uma centena de propostas distintas para as metas de desenvolvimento sustentável e conseguiu selecionar um número reduzido, de doze, onde a linha de corte era um benefício gerado maior do que R$15 por R$ investido. A estratégia de seleção usando análise CB permite estabelecer prioridades apropriadamente e manter um foco em alvos mais importantes. As doze melhores políticas envolveram áreas diversas como tuberculose, saúde maternal e de recém-nascidos, educação, pesquisa e desenvolvimento agrícola, malária, licitação eletrônica, nutrição, doenças crônicas, segurança de propriedade de terras agrícolas, comércio internacional, imunização infantil e migração de trabalhadores qualificados.
Os benefícios sociais esperados envolvem milhões de vidas salvas ao longo do tempo, enquanto que os benefícios econômicos esperados alcançam em torno de 10% de elevação da renda em países mais pobres a cada ano. Os benefícios totais estimados pelos estudos estão na casa de US$1,1 trilhões mais 4,1 milhões de mortes evitadas ao ano, levando a um ganho total de US$2,1 trilhões por ano[2], enquanto que os custos econômicos e sociais estimados destes programas estão em torno de US$41 bilhões por ano, o que dá um benefício impressionante de US$52 por dólar gasto. Adicionalmente, embora o custo de US$42 bi pareça elevado, ele é na verdade baixo e factível, considerando o que o se gasta em outras políticas com pior relação CB.
Para que este projeto não decepcione como as Metas de Desenvolvimento Sustável da ONU, é necessário ter foco e saber priorizar programas e políticas. Como já disse Steve Jobs: “As pessoas acham que foco significa dizer sim para aquilo em que você deve se concentrar. Mas não é isso que significa. Significa dizer não às centenas de outras boas ideias que existem. Você tem que escolher com cuidado. Na verdade, estou tão orgulhoso das coisas que não fizemos quanto das coisas que fiz. Inovação é dizer não para 1.000 coisas.”[3]
O Brasil pode se beneficiar imensamente das ideias contidas no livro do Lomborg. Temos um enorme potencial para crescer e prosperar com inclusão social, mas insistimos em fazer escolhas erradas, seja porque não fazemos avaliações corretas, seja por opções de nossa classe política. Que tal começarmos a estabelecer prioridades e escolher projetos sociais mais eficazes, se beneficiando, com a devida e necessária adaptação às nossas limitações, de estudos já realizados que dão o caminho das pedras? Não podemos deixar esta grande oportunidade passar em branco!
[1] Lomborg, B. Best Things First, 2023.
[2] Dá para somar vidas poupadas com retorno monetário? Dá sim! Para tal, economistas calculam o valor estatístico de uma vida. Esta conversão é importante para analisar os benefícios sociais de políticas públicas, portanto… não se apavore!
[3] Lomborg, Bjorn. Best Things First (pág. 53).
1 comentário
Coluna excelente, sempre trazendo argumentos ponderados e embasados. Faz muito sentido, quem persegue o ótimo não faz o bom, meu pai sempre dizia, tem que focar no próximo passo possível. Parabéns.