ESG é uma sigla que vem do inglês (Environmental, Social, Governance) e diz respeito a três fatores considerados essenciais para a mensuração do impacto ético e de sustentabilidade de um investimento em um negócio ou empresa. Muitos investidores hoje em dia preferem selecionar empresas que usam critérios ESG para direcionar seus investimentos. ESG também é um termo genérico em mercados de capitais para avaliar o comportamento de corporações e determinar seus desempenhos financeiros futuros.
Há cinquenta anos, o Prêmio Nobel em economia, Milton Friedman, escreveu um importante artigo argumentando que a única responsabilidade social das empresas é a maior criação possível de valor para seus proprietários ou, em suas próprias palavras, “existe uma e apenas uma responsabilidade social das empresas, que é usar seus recursos e se engajar em atividades para aumentar seus lucros, enquanto estiver de acordo com as regras do jogo, isto é, enquanto ela compete de forma aberta e livre, sem praticar fraudes”[1]. Desde então, até pelo menos o início do século XXI, esta tem sido a palavra de ordem e estratégia das empresas em sociedades de mercado, mas com a ascensão da ideia ESG a partir dos anos 2000 a noção de responsabilidade social mudou e começou a abraçar outros objetivos, como sustentabilidade ambiental, cuidados com a comunidade onde as empresas estão inseridas e diversidade entre seus funcionários. O predomínio do interesse dos seus proprietários (os acionistas, ou shareholders) foi reduzido em detrimento dos interesses dos grupos pessoas que são afetados pelos processos e resultados das empresas (stakeholders). A questão que surge então é se esta mudança de ênfase é desejável ou não, sendo que o tema levou a importante revista inglesa The Economist a dedicar a matéria de capa (The Political CEO) da edição de 17/04/2021 ao assunto[2].
É importante tentar entender o que Milton Friedman escreveu e o que isto significa. “Lucros” significa valor de longo prazo para o proprietário, isto é, o valor de longo prazo da empresa. Isto captura também a ideia de que uma empresa pode tomar decisões que reduzem o lucro de curto prazo, mas o aumentam no médio e no longo prazo. Gastos com investimento são um bom exemplo.
A ideia de maximizar o valor para os proprietários tem sido bem sucedida porque em muitos casos a maximização de lucros dos shareholders está em plena harmonia com a criação de valor para os stakeholders. A maneira de aumentar lucros de uma empresa é convencer seus fornecedores a assinar contratos com ela, atrair, contratar e manter bons funcionários, e convencer seus clientes a adquirir seus produtos. Desta forma, todas as partes envolvidas saem ganhando. Na coletiva de imprensa após o retorno de seu voo espacial, o bilionário americano e proprietário da Amazon, Jeff Bezos, reconheceu este fato ao agradecer a seus clientes e funcionários por ter tornado possível esta aventura. Empresas são, afinal de contas, uma forma de estabelecer cooperação entre diversos grupos de interesses para que estes possam alcançar seus objetivos concomitantemente.
Ao longo dos anos, um número cada vez maior de clientes e funcionários gostaria de ver um maior engajamento das empresas em causas sociais e ambientais, de forma que pode ser lucrativo para elas corresponder a estas demandas. Esta reação é chamada de ESG estratégico, pois o engajamento em certas causas sociais e ambientais por parte de empresas pode aumentar seus lucros ao satisfazer melhor as demandas dos seus stakeholders. O McDonald’s, por exemplo, com seus programas filantrópicos em prol da saúde de adolescentes e crianças com câncer, se torna mais simpático ao público em geral e aprimora seus laços com as comunidades envolvidas, levando a maior criação de valor para seus acionistas e stakeholders. O apoio de inúmeras empresas à preservação de parques, rios, reflorestamento e proteção à fauna nativa, bem como doações a hospitais, igrejas, ONGs e outras organizações de caráter não lucrativo, representam bem esta ação de ESG estratégico.
Entretanto, nem todas as atividades de ESG ajudam na criação de riqueza e podem prejudicar ambos acionistas e stakeholders. Uma empresa que se engaja em atividades que reduzem seus lucros de longo prazo reduz também sua capacidade de criar valor para seus proprietários, fornecedores, clientes e outros grupos que se beneficiam de suas ações. Existem, adicionalmente, outros problemas possíveis com o engajamento em atividades ESG, que são os dilemas que surgem naturalmente pelo fato de uma empresa assumir múltiplos objetivos em detrimento de seus lucros de longo prazo. Considere o caso de uma montadora de automóveis, que cogita fechar uma planta que produz carros a gasolina no sudeste no país e abrir uma nova planta de carros elétricos na região sul. Se a montadora tomar esta decisão, ela contribuirá com o objetivo de sustentabilidade ambiental ao deslocar a produção para carros que não emitem CO2 e com o objetivo social de levar atividade econômica e aumento de emprego a outra região. Em contrapartida, ao tomar esta decisão ela contribuirá negativamente para o emprego de funcionários dos seus fornecedores tradicionais e para o nível de emprego na atual região, além de prejudicar seus clientes por deixar de vender um produto mais barato que é acessível aos consumidores mais pobres. Com múltiplos objetivos de ESG, qual deve ser o critério de decisão da montadora? Quais destes objetivos ela deve priorizar? Sem priorizar o critério de maximização de lucros, seus gestores podem tomar qualquer decisão e justifica-la por algum critério ESG, o que torna a ideia de responsabilidade social via ação ESG sem sentido, pois ser mais socialmente responsável por um critério pode equivaler a ser menos socialmente responsável por outro.
O fato é que cada vez mais as pessoas nas nossas sociedades valorizam os ideais de preservação ambiental, de ambientes de trabalho com maior diversidade e sem qualquer tipo de assédio e de maior prática filantrópica por parte das empresas. Empresas que conseguirem identificar melhor estas novas demandas e aumentar seus lucros praticando o ESG estratégico colocarão um volume maior de riqueza e valor nas mãos dos seus proprietários, fornecedores, funcionários, clientes e outros grupos que se beneficiam de suas atividades. Desta forma, elas estarão atuando com responsabilidade social, exatamente como Milton Friedman explicou há cinquenta anos.
[2] https://www.economist.com/leaders/2021/04/15/the-political-ceo
1 comentário
Texto muito esclarecedor, até para leigos como eu.