Começamos a semana, em que se celebra a morte de Cristo, falando da obra-prima que retratou inigualavelmente, pela música, a paixão e a morte do Senhor.
A Paixão segundo Mateus, “oratório” (ver definição adiante) de Johann Sebastian Bach, representa musicalmente o sofrimento e a morte de Jesus Cristo segundo o Evangelho de São Mateus. Com a duração de mais de duas horas e meia (em algumas interpretações, mais de três horas), é uma das obras mais importantes de Bach e uma das obras-primas da música ocidental.
Divina, não somente por referir-se a Cristo como pela inspiração e pela música.
Oratório, gênero musical dramático, é apresentado em forma de concerto, sem representação cênica, sem cenários e sem figurinos e pode tratar de assunto religioso, histórico ou mitológico. Outro oratório, talvez mais conhecido, é o Aleluia, de Häendel.
A Paixão segundo Mateus foi composta para solistas, coro e orquestra e tem um narrador, que narra os textos do Evangelho também em forma de canto.
Os vídeos da internet têm legendas.
Bach musicou os textos dos Capítulos 26 (Versículos 1 a 75) e 27 (Versículos 1 a 66) do Evangelho de Mateus para compor o Oratório. Picander, pseudônimo de Christian Friedrich Henrici (1700 – 1764), poeta alemão, escreveu os recitativos do oratório, que são intercalados com os textos do Evangelho.
Maravilhoso como Bach consegue converter em música os recitativos e o texto do Evangelho de Mateus!
Como não havia cinema e nem imagens na época, o compositor clássico descrevia as emoções e os sentimentos pela música.
O pianista Alvaro Siviero faz explanação sobre a obra que é considerada a maior contribuição de Bach para a literatura musical do Ocidente.
Bach inicia a obra com um jogo de perguntas e respostas. O coro número 1 fala do “noivo”, que é Jesus, conforme ele se descreveu na Parábola das 10 Virgens. O coro nº 1 está “vendo” Jesus carregando a cruz pelas ruas de Jerusalém e fala do “noivo”. O coro nº 2 pergunta “quem?”, “quem?”, como se o povo se aglomerasse para ver o Homem carregando a cruz e perguntasse quem era ele. Acesse o site para ouvir a introdução. Não há legendas, mas é fácil identificar o duelo musical entre as palavras “noivo” e “quem”.
Ao musicar o trecho do Evangelho que cita o açoite a que Cristo foi submetido, o arco como que açoita o violino e produz som sibilante, à semelhança de um chicote cortando a carne de Cristo.
Não há música alegre e nem vibrante na Paixão segundo São Mateus; há música dramática, que leva à meditação para fazer imaginar a dor e o sofrimento de Cristo na paixão.
Há que saber ouvir a Paixão segundo Mateus; há que ouvir com o coração. Há que buscar o sentimento por detrás da música. Há que sentir o que o compositor pretendeu transmitir com aquelas notas. Há que tentar “enxergar” pelo som e pela emoção.
É música para se ouvir concentrado, vivendo-a e sentindo-a na alma. Não é música para ser ouvida enquanto se dirige, ou enquanto se faz outro trabalho.
Estamos acostumados a, nos filmes, ver a cena tendo ao fundo a música correspondente: música romântica para cena romântica, música de suspense para cena de suspense e assim por diante.
A música clássica tem de ser ouvida “imaginando” a cena que a música retrata e o sentimento que o compositor transmitiu naquele momento com aquelas notas. Pode exigir treinamento e concentração. Contudo o resultado será surpreendente.
Você deve ter ouvido trechos da Paixão segundo Mateus como tema de filmes e não sabe.
Pier Paolo Pasolini usou a Paixão segundo São Mateus na trilha sonora do seu filme “O Evangelho segundo São Mateus” (1964) e também em seu primeiro filme, “Accatone”, de 1961.
George Lucas usou trecho da Paixão na cena final do seu primeiro filme, “THX 1138” (1971).
O cineasta russo Andrei Tarkovsky usou recitativos da Paixão na abertura do filme “O Espelho” e no seu último filme “O Sacrifício” (1986).
Trechos de “A Paixão segundo São Mateus” enriqueceram os filmes “Casino”, de Martin Scorsese, “O Demolidor” (1993), de Marco Brambilla, e “O Talentoso Ripley” (1999), de Anthony Linghella.
Trecho de A Paixão segundo São Mateus também é utilizada para retratar a história de amor e sofrimento do personagem principal de “A Vida Oculta” (2019), de Terrence Malick.
Na Paixão segundo São Mateus, você “ouvirá” o sofrimento de Cristo e se emocionará com a música de Bach.
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Maravilha!