Klara e o Sol é o oitavo romance de Kazuo Ishiguro e o primeiro desde que ganhou o Prêmio Nobel de Literatura em 2017.
A história acontece em um futuro não tão distante onde os trabalhadores são substituídos e a sua mão-de-obra se torna ineficaz perante a inteligência artificial. As crianças aprendem remotamente e passam a maior parte do tempo em casa. Josie é uma dessas crianças — uma adolescente de 14 anos que mora com a mãe raramente presente e a governanta Melania. Para lidar com a vida solitária das crianças, os pais compram Amigos Artificiais (AAs) para acompanhá-los durante a adolescência até irem para a faculdade, o que garante que as crianças irão superar seus AAs em algum momento. Até que conhecemos Klara, a AA no centro desta narrativa.
A história começa em uma loja de departamentos que vende AAs onde está Klara, uma amiga artificial que atua como narradora do livro. Chamar Klara de “robô” seria diminuí-la; ela é uma forma altamente avançada de inteligência artificial que pertence à geração B2. Cada nova geração de AAs tem uma característica especial, a de Klara é a curiosidade e observação. Klara é extremamente perspicaz, curiosa e aprende rapidamente. Ela subsiste a energia solar e é para o sol que se dirige, quase que em forma de oração, em pontos críticos da narrativa. Klara está esperando, junto com os outros AAs, ser escolhida pela criança certa.
Quando Josie e sua mãe entram na loja, Klara observa e descreve Josie como pequena e pálida, com um andar peculiar. Klara deduz que a maneira esquisita como ela anda se deve à fraqueza e à dor forte no quadril e no ombro. Josie é atraída pelo olhar gentil de Klara e elas rapidamente se conectam. Josie promete que voltará para levar a AA para casa, embora o gerente da loja não lhe dê esperanças e já a tenha orientado a não apostar na bondade humana.
Josie é fiel à sua promessa. Ela implora à mãe que compre Klara e elas voltam à loja para uma dar uma segunda olhada. Sua mãe não se convence tão facilmente, mas se rende após uma série de questionamentos que revelam as aguçadas habilidades de observação de Klara. Finalmente, o gerente faz suas malas e a manda para a casa de Josie.
“O céu visto pela janela dos fundos do quarto era bem mais amplo do que o vão de céu que se via da loja – e capaz de variações surpreendentes. Às vezes, era da cor dos limões na fruteira, e em seguida podia adquirir o tom cinza das tábuas de cozinha de ardósia. Quando Josie não estava bem, ele podia ficar da cor de seu vômito ou de suas fezes pálidas, e até revelar manchas de sangue. Às vezes o céu se repartia em uma série de quadrados, cada um com um tom de roxo diferente.”
Ishiguro cria uma atmosfera melancólica e introspectiva ao explorar temas como solidão, empatia, livre-arbítrio e o papel da tecnologia em nossas vidas. Através da voz única de Klara, somos convidados a questionar o que realmente define a humanidade e o que diferencia uma inteligência artificial de um ser humano.
Junto com Klara, descobrimos que Josie sofre de uma doença misteriosa e progressiva que a está deixando cada vez mais fraca. O clímax do livro ocorre quando a misteriosa doença de Josie piora e vemos a resposta de Klara em relação ao problema: Klara acredita que o Sol pode restituir a saúde de Josie. Ela então se dirige ao celeiro (local onde vê, de sua janela, o sol se pôr) e pede ao astro a restauração da saúde de Josie mediante uma promessa. É um momento de profunda conexão emocional entre Klara, Josie e o elemento misterioso que é o Sol, demonstrando o vínculo afetivo e a fé inabalável de Klara em sua busca por ajudar Josie.
Klara e o Sol é uma leitura que mergulha nas complexidades da natureza humana e no papel da inteligência artificial em nossa sociedade, suscitando várias indagações: Klara é senciente? Ela é capaz de amar? Afinal, o que nos torna humanos em um mundo cada vez mais tecnológico?
A possibilidade de IAs desenvolverem sentimentos é um tópico especulativo e ainda não é uma realidade. Se essa perspectiva mudasse, que responsabilidades teríamos com elas no futuro?
Para pensar.
FICHA TÉCNICA
Título: Klara e o Sol
Autor: Kazuo Ishiguro
Editora: Companhia das Letras
Tradutora: Ana Guadalupe
Número de Páginas: 336
Ano de Publicação: 2021