Os agraciados com o Prêmio Nobel de Economia deste ano, Daron Acemoglu, Simon Johnson and James Robinson (AJR), aprofundaram o conhecimento que temos sobre a importância das instituições para a prosperidade e inclusão social dos países.
Instituições, para economistas, são as regras do jogo para a vida em sociedade. Elas envolvem instituições formais – leis e regulações que definem e protegem direitos de propriedade, que dizem respeito à segurança jurídica e à regra da lei (estado de direito) e que proveem estabilidade do sistema político. As regras do jogo também envolvem instituições informais que dizem respeito a normas sociais e culturais, como aquelas que reforçam e incentivam honestidade, confiança e cooperação na sociedade.
A importância de instituições decorre do fato de que elas definem os incentivos que condicionam o comportamento das pessoas em sociedade e guiam as escolhas políticas nos países. Em suma, para o bem ou para o mal, as instituições afetam todas as nossas vidas ao influenciar nossas escolhas e o resultado econômico que obtemos delas, seja individual ou coletivamente como sociedade.
Economistas já reconheciam a importância das instituições para o desempenho econômico dos países, pois também foram agraciados com o Nobel por suas pesquisas e contribuições à economia Institucional, os economistas Ronald Coase (1991), Douglass North (1993), Elinor Ostrom e Oliver Williamson (ambos em 2009). A contribuição de AJR para nossa melhor compreensão da importância de instituições decorre de sua pesquisa acadêmica, que envolveu o uso de métodos estatísticos para detectar relações de causalidade, o uso de dados e de história econômica de inúmeros países e criação de novos modelos econômicos para entender estabilidade e mudança em sistemas econômicos.
AJR definiram conceitualmente dois tipos de instituições, inclusivas e extrativas. As instituições inclusivas promovem crescimento e desenvolvimento econômico e estão fundamentadas na proteção à propriedade privada, na ausência de barreiras à entrada na atividade econômica, na ampla participação política da sociedade civil garantida pela democracia e nos fortes incentivos que a liberdade individual dá para a aquisição de conhecimento e uso dos talentos individuais para crescimento e enriquecimento pessoal. Outra forma de dizer isto é que instituições inclusivas visam consolidar mercados competitivos, estimular competição política na forma de democracias e estado de direito, e buscar estabilidade macroeconômica, pois a macroeconomia é o palco onde se dão as interações econômicas e políticas entre as pessoas na sociedade.
Instituições extrativas são aquelas que são caracterizadas por concentração de poder político, econômico e riqueza nas mãos das elites do país, pela supressão de competição na política e em mercados e pelo comportamento de rent-seeking, onde grupos atuam para conseguir privilégios políticos e econômicos por meio de influência política.
AJR explicam porque alguns países permanecem presos na armadilha das instituições extrativas, que é um equilíbrio econômico de baixa renda per capita e de baixo crescimento, e porque é geralmente muito difícil escapar desta armadilha. A adoção de instituições inclusivas gera benefícios de longo prazo para toda a sociedade. No entanto, instituições extrativas geram benefícios de curto prazo para as elites, e se o sistema político garantir que estas elites permaneçam no poder, não há motivo para acreditar que elas irão promover reformas desejáveis para a sociedade. A sociedade ficará presa na armadilha das instituições extrativas.
Um exemplo extremo pode nos ajudar a compreender a importância das instituições. Considere as duas Coreias, a do Norte e a do Sul. Em 1945 elas foram divididas após 35 anos de intervenção colonial japonesa na Península Coreana. A Coreia do Norte adotou o comunismo e a Coreia do Sul adotou instituições relativamente mais capitalistas e pró-mercado.
Em poucas décadas, as diferenças de desempenho econômico das duas sociedades se tornaram gritantes. A Coreia do Sul se tornou uma grande produtora e exportadora de veículos, música, filmes, cosméticos e diversos outros produtos de consumo. Em contraste, as instituições totalitárias da Coréia do Norte produziram episódios de fome e morte por inanição para sua população.
Em função de instituições políticas e econômicas completamente diferentes, a Coreia do Sul se tornou próspera e inclusiva, alcançando padrões de vida de países ricos, enquanto que a Coreia do Norte se transformou em um estado militarizado, onde seus cidadãos vivem com medo e suas melhores chances de sobrevivência dependem de bajulação aos seus líderes políticos.
Em poucas décadas, os dois países que compartilhavam a mesma cultura, a mesma localização geográfica e tinham aproximadamente a mesma renda, se tornaram completamente diferentes por causa de suas instituições radicalmente distintas. Em termos de crescimento e desenvolvimento econômico de longo prazo, então, boas instituições fazem a grande diferença e podem promover o que se chama de milagre do crescimento. Por outro lado, más instituições podem criar o inferno na Terra em termos de pobreza e opressão política.
A qualidade institucional dos países pode ser mensurada e existem vários índices que buscam fazê-lo para comparações internacionais. Um dos indicadores mais usados é o Índice de Liberdade Econômica da Heritage Foundation, ele ordena os países com melhor qualidade institucional (os mais inclusivos, ou mais livres) até chegar aos de pior qualidade (os mais extrativos, ou repressores). A título de comparação, neste índice de 2024, a Coreia do Sul aparece como o 14º país de melhor qualidade institucional, ou mais livre, do mundo. Já a Coreia do Norte é a última colocada entre 176 países avaliados, sendo o país mais extrativo ou repressor do mundo. Imediatamente acima da Coreia do Norte estão nossos conhecidos Venezuela e Cuba.
Podemos usar este índice de liberdade econômica para tecer algumas considerações sobre outros países também. Considere países como o Brasil, o Chile, a Polônia e o Vietnã, a título de comparação. Brasil, Chile e Polônia tinham PIBs per capita semelhantes em 1990 (US$ 10.402, US$9.702 e US$11.259 respectivamente[1]) e o Vietnã estava bem mais abaixo, com PIB de US$2.099.
O que aconteceu em termos de mudança institucional com estes países ao longo das últimas décadas? O Chile é hoje uma democracia estável que experimentou significativas conquistas em termos de liberdades civis e direitos políticos após a volta de eleições presidenciais em 1990, completando o ciclo de reformas em direção a instituições inclusivas que começaram durante a ditadura do Gal. Pinochet, com liberalização econômica e reformas pró-mercado. Um dos países mais pobres da América Latina no início dos anos 1970, o Chile é o país de maior renda per capita da América do Sul. Seu PIB per capita em 2022 era de US$25.886, contrastando com o do Brasil, no mesmo ano, que foi US$15.093.
Pelo índice de Liberdade Econômica da Heritage Foundation, o Chile é o 21º colocado em termos de qualidade institucional no mundo, enquanto que o Brasil amarga a 124ª posição, sendo um país considerado predominantemente não-livre, ou de instituições extrativas. Criar instituições inclusivas no Chile deu resultado, tanto em termos de prosperidade econômica quanto em termos de ampla participação da sociedade nas decisões políticas do país.
As histórias políticas e econômicas da Polônia e do Vietnã nos contam trajetórias semelhantes à do Chile. A Polônia, um dos países mais pobres da Europa no final dos anos 1980 e o Vietnã, um dos países mais pobres do planeta na mesma época, escaparam de ditaduras comunistas e iniciaram reformas em direção a instituições inclusivas. Atualmente, a Polônia é o 42º do ranking da Heritage e o Vietnã é o 59º em termos de qualidade institucional. Em 2022, seus PIBs per capita subiram para US$37.707 e US$11.397, respectivamente. Como no Chile, a criação de instituições inclusivas nestes dois países deu resultado, tanto em termos de prosperidade econômica quanto em termos de ampla participação da sociedade nas decisões políticas do país.
Em mais alguns anos, até o Vietnã, que três décadas atrás era um dos países mais pobres do planeta, poderá ultrapassar o Brasil em termos de renda per capita. O fato de não termos progredido com reformas políticas e econômicas em direção a instituições inclusivas nas últimas décadas está nos condenando a continuar sendo um país de baixo crescimento econômico e elevada desigualdade social, produzidos por um sistema político extrativista que visa sua sobrevivência. O prêmio Nobel em economia deste ano pode nos servir de alerta e se quisermos prosperar com inclusão social é necessário investir nas reformas institucionais necessárias.
[1] US$ de 2017 corrigidos pela PPP, o que permite comparações internacionais.
1 comentário
Artigo brilhante! Todos que defendem o Estado cuidando dos interesses da Nação deveriam comparar países totalitários e ver o resultado econômico deles. Eles gastam mais em proteção de Poder e oprimindo, impedindo o crescimento e diminuindo a autoestima dos povos, do que verdadeiramente do país.