Conhecer mundos e culturas diferentes – eis o que me atrai a viajar.
A China revelou-se um paraíso.
Comidas, invenções, construções, trânsito, experiências variadas como comer espetinhos de escorpiões fritos na rua; usar o elevador mais rápido do mundo ( Shangai Tower, 20,5m/s); pisar a muralha que pode ser vista do espaço (Great Wall – 21,196Km); interagir com alunos da maior escola de Kung Fu da face da terra (Templo Shaolin – 40.000 alunos); entrar em forma no exército de terracota (mais de 8.000 soldados, 130 carros, 520 cavalos e 150 cavaleiros, tudo em tamanho natural); fazer selfies na praça mais famosa e espaçosa (Tian’anmen – 880x500m).
Após 15 dias, hora de dar adeus e partir para a maior cidade do mundo. Meu voo para Tóquio só partiria dali a duas horas.
Nos relógios do Aeroporto de Beijing, 06 da manhã, horário lá deles. Resolvi tomar o último café chinês.
Após alguns passos, senti me puxarem a barra da calça. Virei e vi o pequeno cão a me cheirar. Levantei o pé para o chute, afinal tamanho não é documento; dizem.
O documento, porém, estava na outra ponta da corda que prendia o cãozinho, e que tamanho!… um chinês de estatura descomunal.
Hesitei fração de segundo e me salvei de cometer um crime hediondo.
O receio de ser mordido ou alvejado, pois ato contínuo o chinês levou a mão ao coldre, fez-me abaixar o pé em câmera lenta.
Descobri que o inglês não é bem uma língua universal, como afirmam.
– Wath’s the matter? Perguntei.
Nada de resposta.
O chino não entendeu a pergunta ou ela o irritou, pois de imediato tomou seu apito e o pôs pra funcionar freneticamente. De início estático ante o surgimento de vários soldados e seguranças, consegui me recuperar rápido e aproveitando a plateia soltei:
– Wenti shi shénmá?
Não me dou ao trabalho de grafar em caracteres chineses, pois ninguém vai entender, presumo eu. Apenas repeti a pergunta feita em inglês.
A resposta, notei, foi abrirem o círculo do lado com parede ao fundo.
O presumível líder da operação apontou o dedo para mim e em seguida para a parede.
Pouco fluente em Mandarim, apenas vocabulário básico de turista que tive o cuidado de preparar e decorar antes de empreender a viagem, sou bem entendido em “Obedecerim” (linguagem na qual os maridos, especialmente eu, têm mestrado e doutorado). Encaminhei-me para o sítio indicado, olhando de soslaio, pois não gostaria de morrer sem aviso, levando tiros pela retaguarda.
Parei junto ao muro e me virei devagar. O chefe, por meio de misto de libra chinesa e cara séria, ordenou-me descer a mochila bem devagar e que a abrisse em seguida, o que fiz de pronto, esvaziando a backpack.
Alguém foi conferir o conteúdo.
Minuciosidade e preciosidade no serviço foi o que observei: pegar cuidadoso; movimentar lento; desembrulhar suave; olhar contra a luz; cheirar; pôr à parte…
Conferência concluída, suspeita extinta, recebi ordem de refazer a mochila.
Minha identificação não foi solicitada. Fiz questão de torná-la conhecida.
Abri o passaporte com visto chinês estampado e o estendi ao chefe. Meio a contragosto ele o pegou, examinou, olhou para mim e com um sorriso amarelo arriscou em português: Brasil, Ronaldinho!
Sorri de volta e soltei baixinho: PQP!!!
Ao sinal do chefe o semicírculo desfez-se, ficando apenas o cachorro, que sentado sobre as patas traseiras, rosnava sem desviar os olhos de mim.
Supondo que em diplomacia canina ele se desculpava pelo incidente, abaixei-me e gentilmente dirigi-me a ele:
– Yuánliang…. (vai em paz…)
Gosto de frango xadrez e quase entro no xadrez chinês.
Escapei de um negócio da china ao avesso…Traficante ali paga a execução.
Só pra tirar a dúvida sobre meu Mandarim, entrei na choperia em frente e pedi educadamente:
– Doing, wo xiang yi pijiu Tsingtao!
A cerveja voltou meus nervos ao estado normal e me fez amaldiçoar mais uma vez a segurança….
SALVIANO, José de Souza.
Capitão Veterano do Exército, Bacharel em Letras pela PUC/MG, cronista e colaborador do Portal iMulher.