“O que a memória ama fica eterno.” Adélia Prado
Resolvi organizar os álbuns de fotografia e a caixinha de memórias no cérebro foi acionada. Revivi mentalmente antigas experiências que estavam na gaveta, as emoções afloraram e até compartilhei #tbt (ThrowBackThursday) na conta do Instagram! Quando os dias ficam difíceis, eu fico nostálgica. Resgato as boas memórias.
Olhando as fotos de meu filho ainda criança tive a nítida sensação da passagem do tempo… parece que foi ontem. Só que não. A memória é elemento intrínseco na jornada da vida e desempenha papel fundamental na construção de nossa identidade. Algumas perduram mais intensamente que outras, como as da infância, a minha própria ou a dele, mas se aceitarmos a sua fluidez, aprendemos a apreciar o impacto significativo que as lembranças exercem em nossas vidas. Recordações não devem causar sofrimento. Devem servir como instrumentos para elevar o espírito e contribuir para a nossa felicidade.
Confusão de memórias
As memórias podem ser muito vívidas. Naquele mesmo dia escaneei uma fotografia tirada em meados dos anos 90 e enviei para a colega que estava comigo na época. Fizemos chamada de vídeo com direito a espumante, choradeira e boas risadas. Tenho a nítida lembrança daquele instante, mas quando falamos, ela sorriu para mim e disse: “Não é assim que eu me lembro.” Oi?!
Existe um equívoco muito comum de que as lembranças sejam registros precisos do passado, fielmente preservadas em um arquivo mental. “A memória realmente não funciona assim”, disse Anne Wilson, professora de Psicologia na Universidade Wilfrid Laurier, cuja pesquisa se concentra amplamente na memória, no tempo e na identidade.
“Reconstruímos o que aconteceu no passado com base em pequenos fragmentos de memória. Agimos juntando os pedaços e colocando-os de volta no lugar.” Isso não significa que distorcemos ou colorimos intencionalmente nossa memória, mas seu processo de recuperação é “altamente reconstrutivo e sujeito a vários preconceitos”, segundo Daniel Schacter, professor de Psicologia na Universidade de Harvard e autor de “Os sete pecados da memória.”
De muitas maneiras, somos o que lembramos. Misturamos e combinamos lembranças, principalmente as mais antigas, o tempo todo, o que não altera a nossa essência. Eu e minha amiga recordamos de formas diferentes daquele mesmo dia e ambas estamos bem com o que registramos na memória.
Lembranças felizes
Tento não me apegar ao passado com muita força, mas há momentos que merecem ser lembrados. Aprendi quando fazia terapia que recordá-los pode ser uma forma eficaz de cultivar sentimentos de positividade. Relembrar intencionalmente as boas experiências ajuda a interromper padrões de pensamento negativos e aliviar a ansiedade.
Alguns exercícios que fazem parte da minha rotina:
- Contar lembranças positivas quando vou dormir à noite, em vez de carneirinhos. O hábito de selecionar da memória experiências que enriqueceram a minha vida ou até mesmo o meu dia;
- Apreciar as fotos antigas. Para pensar: a maioria das fotos é tirada quando estamos sorrindo, comemorando uma ocasião ou simplesmente celebrando a vida. Encare suas fotos como forma de desencadear momentos felizes, que despertaram alegria no passado. Reserve tempo para olhar fotos antigas e compartilhar a lembrança com alguém.
Segundo a escritora Hilde Østby e a neuropsicóloga Ylva Østby, em Adventures in memory, “o destino de uma memória é determinado principalmente pelo quanto ela significa. Memórias pessoais são importantes para nós. Elas estão ligadas às nossas esperanças, nossos valores e nossas identidades. Memórias que contribuem significativamente para nossa autobiografia pessoal prevalecem em nossas mentes.”
As fotos das múltiplas viagens que eu e meu marido fizemos juntos ao longo dos anos me causam genuína felicidade.
Crie novas memórias
Nossas lembranças, por mais dinâmicas e mutáveis que sejam, estão conosco por toda a vida. Cultivar as melhores no coração e na mente tem a sua função terapêutica, mas não podemos viver de nostalgia, no passado. Por mais difícil que seja reter novas informações com o passar do tempo, às vezes precisamos fazer um esforço.
À medida que envelhecemos, nossas novas memórias tendem a reforçar o que já pensamos de nós mesmos. “As memórias estão ligadas ao que te diz respeito, ao que sentes, ao que queres”, afirmam as Østby.
O ideal é que criemos memórias novas e positivas para substituir as negativas que ficaram para trás. Invista em passar o tempo com as pessoas que te fazem bem, com as coisas que te dão alegria e nos lugares que te trazem paz. Criar novas memórias afetivas é fundamental.
Somos as nossas memórias
Minhas fotos favoritas para compartilhar nas redes sociais são duas:
Eu e meu filho na creche durante a comemoração de dia das mães quando ele tinha três anos de idade: estou agachada ao seu lado, de rosto colado, ambos com o sorriso aberto e o amor quase palpável. Olhar para ela mexe com todas as minhas emoções. Amo!
A outra foi em 1988 na festa de formatura (PROM) do colégio que eu estudava em Silverdale, WA, nos Estados Unidos. Fui à cabeleireira naquela manhã, ela triplicou a altura dos cachos e encheu meu cabelo de spray. Me achei o máximo, mas não preciso dizer que, na foto oficial, pareço um poodle de vestido rosa com o rosto carregado de maquiagem.
Ah, os anos oitenta! Pense numa foto que evoca altas gargalhadas!
Por fim…
Valorizo as memórias afetivas. Compreendi que fotografias capazes de despertar bons sentimentos funcionam como presentes que continuam a ser ofertados ao longo de toda a vida.
E você? Qual o seu #tbt favorito?
Para onde te levam as tuas memórias afetivas?
2 Comentários
Boas memórias são como pílulas para revigorar o momento atual, pois nos mostram como é importante o “AGORA”. Concordo plenamente “recordações não devem causar sofrimento”. Adorei os exercícios que fazem parte da sua rotina, irei tentar colocar na minha….rsss. Lê sua coluna é sempre uma imersão de conhecimentos, reflexões, Parabéns!!
Achei lindo esse texto. Eu também passei por esse momento emocionante de organizar fotos. Acredito que vemos o passado como encaramos a vida, com os nossos defeitos, qualidades e limitações, vemos uma parte da realidade. Por isso, cada um vê de maneira diferente, porque guarda aquilo que foi importante para si e não a realidade inteira.