“A confiança é o oxigênio da sociedade” – pode ser considerada a frase que resume a entrevista que Rutger C. Bregman (historiador, autor holandês, cujos estudos de pós-graduação se concentraram em cidades e cidadania) concedeu à escritora Alice Ferraz, do jornal O Estado de São Paulo.
O autor considera que a confiança facilita a vida das pessoas e a torna menos estressante. Inversamente, a falta de confiança leva a maior burocracia e a maior necessidade de advogados. Sua frase cai como uma luva para o Brasil, onde o índice de confiança nas pessoas é muito baixo.
Documentos corriqueiros – contratos de qualquer espécie, convenções de condomínio – devem ser registrados em cartório, com firma reconhecida dos signatários. Para comprovar a residência, ainda que a comprovação seja de interesse do morador, este tem que levar conta de luz ou de água recente. Os brasileiros aceitam esses fatos como normais, justamente porque não confiam uns nos outros e ainda alegam que “precisa ser assim, porque há muitos trambiqueiros no país”.
Fatores vários levam a essas condutas. A burocracia portuguesa que nos foi legada pelos colonizadores, que se manifesta até na Justiça lenta, burocrática e cheia de minudências processuais. A aceitação passiva da mentira: desde a mentira social (diga que não estou) até a mentira dita por políticos em campanha por meio de promessas miraculosas e inexequíveis. Um vídeo, que circula na internet, mostra ex-presidente da República vangloriando-se de haver dito na França que o Brasil tem 25 milhões de meninos de rua e que, ao ser corrigido por alguém da comitiva, riu e se vangloriou da mentira, pois havia sido aplaudido pelo que dissera. Políticos não se importam nem mesmo de dizer mentiras sobre o Brasil fora do país, desde que ganhem minguado apoio dentro dele.
Na citada entrevista, Rutger C. Bregman diz que, desde 1950, sociólogos do World Value Survey (projeto de pesquisa global que explora os valores e crenças das pessoas, como eles mudam ao longo do tempo e que impacto social e político eles têm) fazem pesquisa sobre o grau de confiança das pessoas em diferentes países do mundo, por meio de uma pergunta simples: “Em média, você acredita que as pessoas são confiáveis”? O Brasil é o país do mundo onde há o menor número de pessoas que confiam umas nas outras; a porcentagem daqueles que confiam é de apenas 5%. Na Noruega, a proporção de quem confia é de 75%.
Quando estou dirigindo por uma avenida preferencial, confio que o motorista, que vem da transversal secundária, obedecerá ao sinal de trânsito ou ao sinal de preferencial. Assim, o trânsito flui melhor. Como, no Brasil, as leis de trânsito não são obedecidas, os departamentos de trânsito precisam colocar, além da sinalização, lombadas e quebra-molas antes de cruzamentos. Resultado: piora a vida de todos.
A confiança é a raiz da ordem; somente haverá ordem se todos obedecerem às leis e se houver confiança de que outros as obedecerão.
Confiança atrai confiança. Confiança faz tudo funcionar melhor. Torna-se muito mais exaustivo viver preocupado com o que outras pessoas estão tramando por trás de você ou imaginar que o outro não obedecerá à lei.
O ser humano nasce para aprender, evoluir, relacionar-se e interagir. Aprendemos com as demais pessoas. As religiões pregam o amor, a bondade, a fraternidade. As leis visam ao bem comum. Então, temos o arsenal teórico para confiar uns nos outros.
Precisamos aumentar o nível de confiança, para que possamos viver melhor. Precisamos nos fazer mais confiáveis e precisamos confiar mais nas pessoas.