
Por Simone Hillbrecht
Publicada pela primeira vez em 1881, a história de Pinóquio, escrita por Carlo Collodi, é considerada um dos grandes marcos da literatura infanto-juvenil. Embora muitos a conheçam apenas pela animação da Disney, a narrativa original é profunda e fala sobre a humanidade em seu sentido mais amplo.
Na trama, o velho marceneiro Gepeto, solitário e afetuoso, constrói com suas próprias mãos um boneco de madeira. Desejando profundamente ter um filho, ele trata sua criação com carinho — e, por força de um encantamento, o boneco ganha vida. A partir daí, Pinóquio passa a viver aventuras recheadas de tropeços, mentiras, tentações e provações. Seu maior desejo? Tornar-se um menino de verdade.
Pinóquio é, acima de tudo, uma fábula sobre o poder simbólico da criação. Gepeto não esculpe apenas um brinquedo — ele projeta naquele objeto um vazio a ser preenchido. E é justamente essa relação entre o criador e sua criatura que confere à história sua força emocional.
“Era uma vez… um pedaço de madeira. Não era uma madeira de luxo, mas um simples tronco, daqueles que se colocam nas lareiras no inverno.”
(Primeira frase do livro original)
O boneco, por sua vez, não quer apenas existir: ele quer ser reconhecido como real. Quer ser amado, responsabilizado, integrado ao mundo humano. E para isso, precisa provar que é mais do que madeira animada. Precisa desenvolver virtudes para deixar de ser “quase” e se tornar alguém de fato.
Uma metáfora atemporal
A história de Pinóquio segue atual porque lida com temas que atravessam épocas e contextos:
-
O desejo de preencher a ausência com algo criado pelas próprias mãos;
-
A idealização de figuras que representam o cuidado, a infância e a inocência;
-
O impulso de dar alma ao que, à primeira vista, é apenas forma.
Em tempos em que a fronteira entre o real e o simbólico se torna cada vez mais tênue — seja na arte, na tecnologia ou nos vínculos afetivos — Pinóquio continua a lançar uma pergunta essencial: o que nos torna verdadeiramente humanos?
Para ver com novos olhos
Há várias adaptações da história de Pinóquio disponíveis, cada uma com uma lente diferente. A animação da Disney (1940) é clássica. A versão live-action da própria Disney (2022), estrelada por Tom Hanks, apresenta uma releitura visualmente sofisticada. Já o premiado filme de Guillermo del Toro (Netflix, 2022) oferece uma abordagem mais sombria e filosófica, com elementos do pós-guerra e uma estética que aproxima o conto da literatura existencialista.
Rever Pinóquio, em qualquer uma dessas versões, é mais do que nostalgia, mas uma oportunidade de refletir sobre a natureza dos vínculos que criamos com o mundo à nossa volta.
Há criações que nascem da madeira, outras do silicone, mas todas dizem algo sobre o vazio que tentamos preencher.
Qual a sua versão favorita de Pinóquio?