Por Simone Hillbrecht
Mario Vargas Llosa, autor peruano laureado com o prêmio Nobel de Literatura, faleceu na última segunda-feira, 13 de abril de 2025, aos 88 anos. Sua genialidade literária e evolução política o consagraram como um dos mais influentes intelectuais latino-americanos de sua geração.
Nascido em Arequipa, Peru, em 1936, sua obra diversificada — romances, ensaios, crítica literária e textos políticos — foi traduzida para dezenas de idiomas e conquistou milhões de leitores globalmente.
Destacou-se na década de 1960 como integrante do Boom latino-americano, movimento batizado pelo crítico Luis Harss, que incluía apenas Vargas Llosa, Julio Cortázar, Carlos Fuentes e Gabriel García Márquez — o único grupo literário da história a produzir dois ganhadores do Nobel.
Sua trajetória literária teve início com “A Cidade e os Cachorros” (1963), mas foi “A Casa Verde” (1966) que solidificou sua consagração. Ambientada na Amazônia e em um prostíbulo em Piura, a obra demonstra seu extraordinário domínio da técnica narrativa moderna que lhe rendeu o Prêmio Rómulo Gallegos em 1967.
Em seu discurso de aceitação deste prêmio, Vargas Llosa sintetizou seu credo literário:
“A vocação literária nasce do desacordo de um homem com o mundo, da intuição de deficiências, vazios e impurezas ao seu redor. A literatura é uma forma de insurreição permanente e ela não admite camisas de força.”
O que diferenciou Vargas Llosa de seus contemporâneos foi sua marcante evolução política. Inicialmente simpatizante de ideias socialistas e admirador da Revolução Cubana, passou por profunda transformação ideológica, tornando-se um eloquente defensor do liberalismo clássico e da democracia.
A desilusão com o regime de Castro começou durante o “caso Padilla” em 1971, quando o poeta cubano Heberto Padilla restou preso e forçado a fazer uma autocrítica pública. Este episódio marcou sua virada de pensamento, levando-o a questionar tendências totalitárias nos movimentos de esquerda e, posteriormente, a abraçar princípios liberais democráticos.
“O Chamado da Tribo” (2018) representa sua autobiografia intelectual e um manifesto em favor do pensamento liberal. Neste ensaio, analisa as ideias de seus sete mentores intelectuais — Adam Smith, José Ortega y Gasset, Friedrich Hayek, Karl Popper, Raymond Aron, Isaiah Berlin e Jean-François Revel — e suas contribuições para a filosofia liberal: a importância dos mercados livres; a crítica à massificação e defesa da individualidade; a ideia de ordem espontânea e o papel limitado do governo; a defesa da “sociedade aberta” e a crítica ao historicismo; a oposição ao totalitarismo e a defesa do pluralismo político; a distinção entre liberdade negativa e positiva e a defesa da democracia liberal frente às utopias totalitárias.
Em 1990, Vargas Llosa concorreu à presidência do Peru, defendendo reformas de livre mercado durante uma grave crise econômica. Apesar da derrota para Alberto Fujimori, a campanha evidenciou seu compromisso com suas convicções.
Ao longo de sua vida, permaneceu crítico ferrenho do autoritarismo em todas as suas formas. Condenou ditaduras por toda a América Latina e defendeu consistentemente a liberdade individual e as instituições democráticas como pilares para a prosperidade e dignidade humana.
Em 2010, recebeu o Prêmio Nobel de Literatura pela cartografia das estruturas de poder e suas imagens vigorosas sobre a resistência, revolta e derrota individual, de acordo com a Academia Sueca, que organiza o evento.
Em 2021, tornou-se o primeiro escritor a entrar na Academia Francesa sem nunca ter escrito em francês e assumiu a cadeira de número 18. Ele também era membro da Academia Peruana de Línguas, da Real Academia Espanhola, e sócio correspondente da Academia Brasileira de Letras (ABL).
O falecimento de Mario Vargas Llosa marca o fim de uma era.
A Literatura perde um de seus brilhantes escritores e a Liberdade perde um de seus mais ferrenhos defensores.
Obras indicadas
A Cidade e os Cachorros (1963)
Conversa no Catedral (1969)
A orgia perpétua – La orgía perpetua: Flaubert y «Madame Bovary» (1975)
Tia Julia e o Escrevinhador (1977)
A Guerra do Fim do Mundo (1981)
A Civilização do Espetáculo (2012)