Dar o título “Ano Bissexto e Trovas” ao artigo e ao longo dele falar sobre trovas parece incoerente. Que pode ano bissexto ter que ver com trovas? Leia até ao final e você entenderá a conexão que faço entre um e outro. Poderá até emocionar-se com a conexão e com emoções que os temas me despertam.
TROVA
A Sociedade Artística Brasileira (SABRA) define trova como “o poema de quatro versos, cada um com sete sílabas, os quais formam uma estrofe com sentido completo”. As pessoas que recitam as trovas são chamadas “trovadores”.
As características da trova são os quatro versos de sete sílabas cada um, que formam um poema de sentido completo. A rima é obrigatória na trova pelo menos do segundo com o quarto verso. A trova não tem título; o seu texto transmite integralmente a mensagem pretendida.
A SABRA destaca que “a trova é considerada o único gênero literário exclusivo da língua portuguesa”.
ORIGEM DA TROVA
A trova tem origem nos tempos medievais. O rei de Portugal D. Dinis (1261-1325), conhecido como “O Rei Trovador”, incentivou a produção poética em sua corte. Ele mesmo foi bom trovador; é autor de mais de 140 cantigas líricas e satíricas.
Depois do descobrimento, os portugueses trouxeram a trova para o Brasil.
GÊNEROS DE TROVAS
Os autores classificam as trovas em líricas, filosóficas e humorísticas.
Trovas Líricas – São subjetivas e refletem o estado da alma ou romance. Exemplo:
Mentimos como convinha
Mas tu bem mais, francamente.
Eu jurei fazer-te minha
Tu disseste: “Eternamente”.
Filosóficas – marcadas pela racionalidade, procuram definir ou conceituar uma ideia:
Saudade…sombra, fantasma…
Coisa que bem não se explica:
Algo de nós que alguém leva;
Algo de alguém que nos fica.
Humorísticas – abrangem composições satíricas e anedóticas.
Teus vestidos eu não acho
Mui decentes, minha prima.
São altos demais em baixo
E baixos demais em cima.
AUTORES DE TROVAS
As trovas costumam cair no gosto popular a tal ponto que são decoradas com facilidade e o seu autor é esquecido. Talvez porque as trovas não têm título; talvez por serem completas na ideia transmitida; talvez por injustiça dos trovadores.
Como as citadas acima; guardei o texto e esqueci o autor.
PADRE CELSO DE CARVALHO
Eu guardo na memória o Padre Celso de Carvalho (1913 – 2000). Teólogo, professor de Português e de Filosofia, escritor, poeta e trovador, um dos maiores trovadores do Brasil.
É dele a letra da música “Diamantina em Serenata”, hino não oficial de Diamantina, que tem bela estrofe que define a cidade:
Essas ruas serpeantes
É tão fácil entendê-las:
Descem doidas por diamantes
Sobem ávidas de estrelas.
Suas trovas são ricas de rimas e de conteúdo:
Dez minutos de ternura,
Olhando uma simples flor!
Se é tão linda a criatura,
Que pensar do Criador?!
Ele escreveu muitas trovas e poesias sobre saudade:
Entre os mistérios humanos,
Esse é o que mais me crucia:
– passa o tempo de dez anos,
Fica a saudade de um dia!…
ANO BISSEXTO
Fevereiro de 2024, ano bissexto, me trouxe à memória o Padre Celso de Carvalho, que é o autor da mais bela e expressiva trova sobre anos bissextos:
A ideia do ano bissexto
Nos vem da Astronomia.
Mas, no fundo é só pretexto
Para viver mais um dia.
O Padre Celso conseguia fazer poesia com Astronomia, ciência natural que estuda fenômenos fora da Terra, para despertar poesia e sensibilidade no interior das pessoas.
Mais que nunca, o mundo corrido de hoje precisa de poesia, de sentimento e de romantismo. Somente quem tem sentimento e romantismo dentro de si aprecia a poesia das palavras, da vida e dos sentimentos.
Sentimentos e poesia por vezes adormecidos em nós, precisam de quem os desperte e nos faça transbordar de sensibilidade e sentimentalismo.
Precisamos de romancistas, poetas, trovadores e de Padres Celsos de Carvalho.
Precisamos de quem nos inspire, desperte, mova e aconchegue sentimentos e poesia.
Cláudio Duarte.
Colunista e colaborador do PortaliMulher, é natural de Diamantina, Minas Gerais.
2 Comentários
“Para viver mais um dia”…
Pois se não é o desejo eterno da humanidade! Desejamos viver “mais um dia” e esquecemos de viver bem todos os dias. Atropelamos nosso dia na correria.
Mais sentimentos! Adorei a mensagem! Obrigada!
Na condição de Presidente da UBT Seção de Santos/SP, agradeço a menção de Carolina Ramos, corrigindo apenas o título da mesma. A ela foi concedido pela UBT Nacional o título de Princesa da Trova, completando o quarteto real da trova no Brasil.