(*) – Ara Chloropterus é o nome científico da arara-vermelha ou arara-vermelha-grande, espécie de ave psitaciforme, nativa das florestas do Panamá, Brasil, Paraguai e Argentina. Sua alimentação é baseada em sementes, frutas e coquinhos.
NO BANHEIRO
Um grito vindo do banheiro…
Todos correm a ver o que é. Porta destrancada, entram de supetão. A mãe, como que petrificada, diante do espelho.
– Quê que foi mãe?
– Meu Deus, tô velha, olhem os cabelos brancos!
– Calma, mãe, só uns fios. Pra que escândalo?
– Que escândalo que nada! Como é que vou sair de casa assim? Como posso viajar? E o seu pai, não vai mais ligar pra mim!
– Mãe, todo mundo fica de cabelos brancos um dia. Olhe a cabeça do papai, tá mais pra Papai Noel que pra John Travolta.
– Mas ele é homem e ninguém repara. Agora é que não entro mais em fila nenhuma. Tô até vendo: “Vovó, a fila preferencial é aquela ali, oh!”
– Mamãe, amanhã a gente vai na cabeleireira, e resolve isto. Ela vai achar o corte e a cor de cabelo bons pra senhora, acredite!
DIA SEGUINTE, NO SALÃO IDOSA FELIZ
– Olha, sugiro um corte estilo Margaret Thatcher e cor Majirouge 666 (nada tem a ver com a besta apocalíptica) da L’Oreal. Isso vai remoçar a senhora em mais de dez anos.
– Arara Vermelha é o que vou parecer!
– Fica tranquila, a senhora se acostuma e vai amar seu novo look.
Após a primeira tintura, pensou ela, bastaria ficar reclusa por uma semana até acostumar-se. Assim fez.
Nessa semana, os filhos arranjaram visitas e as orientaram para elogiar o novo penteado da mãe. Nos bate-papos rolaram elogios pelo novo visual, o que a deixou satisfeita e com a autoestima elevada.
SAINDO DE CASA
Na semana seguinte, uma excursão rápida pelo shopping, onde notou cabelos no seu tom. Bom, não chegam aos “cinquenta tons”… é verdade.
No sábado, como teste definitivo comparece às bodas da filha de amigos. Nenhum olhar analítico mais profundo ou enviesado. Consolidam-se a nova aparência e a aceitação. A paz volta a reinar.
Mas…
“NÃO HÁ BEM QUE SEMPRE DURE”
Parece que foi apenas uma trégua!
Tempos depois, na loja de cosméticos:
-Sinto muito, senhora, a Majirouge 666 não é mais fabricada.
– Não tem no estoque?
– Tem não; a dona de um salão arrematou o que havia na semana passada.
– Egoísta! Sabe o nome do salão?
– Não é daqui não, senhora; é do interior, de Iranduba, eu acho.
– Tenho uma amiga lá. Vou ligar, ela descobre e compra para mim.
Pagou o dobro do preço, mas conseguiu dez tubos, um alívio. Seguro morreu de velho, dizem.
VIA CRUCIS
Mais tarde, tem início via crucis por farmácias e casas de produtos de beleza à caça da 666. Nem pra remédio encontra. Volta ao Idosa Feliz.
– Essa é a cor mais próxima da sua. A diferença é tão pequena que quase não dá pra notar.
Tinta aplicada, volta pra casa dispensando a secagem. Cabelo molhado mascara a cor final da tinta. Não gostou quando secou.
Dia seguinte volta ao salão.
– Vamos fazer descoloração e depois outra aplicação, falou a cabeleireira.
Pior a emenda que o soneto. A aparência agora tá bem de Arara Vermelha. Até os netos começam a tirar sarro:
– Vovó, a senhora já sabe voar, ou vai ter que fazer curso que nem pra andar de bicicleta?
Nada há tão ruim que não possa piorar. A vovó com promessa de acompanhar os netos à Disney anda desorientada, pois ficou sabendo que o serviço de imigração do país não permite entrada de aves raras.
EM BUSCA DA TINTA IDEAL
Nada a ver com o Santo Graal; ótimo nome para filme.
A esperança é que o provérbio se complete: “…nem mal que nunca se acabe.”
Espero o fim da maldição “Ara Chloropterus”…
SALVIANO, José de Souza.
Capitão Veterano do Exército, Bacharel em Letras pela PUC/MG, cronista e colaborador do Portal iMulher.
1 comentário
👋👋👋👋👋Parabéns pela cronica… Ainda bem que não disseram como ja ouvi: ” lavou o cabelo com água de salsicha …