Por Simone Hillbrecht
A Dica Cultural de hoje é o clássico ‘Os Irmãos Karamázov’, o último romance publicado de Fiódor Dostoiévski.
Não sou especialista em literatura russa e não pretendo aqui me aprofundar nas questões filosóficas, psicológicas e altamente complexas presentes na narrativa deste livro. Apenas sugerir a leitura do que considero uma obra-prima da literatura mundial.
Na opinião de Freud e Nietzsche, trata-se da “maior realização literária da história da humanidade”. Ainda que eu tenha gostado demais do livro, continuo achando “Crime e castigo” insuperável.
Atenção: contém spoilers!
A edição da Editora 34 foi a primeira a ser traduzida diretamente do original em russo. Paulo Bezerra, que já traduziu várias outras obras do russo para o português, também é o autor do posfácio no final do livro. Quem quiser se atrever nas mais de mil páginas divididas em dois volumes, contará com excelentes notas de rodapé que ajudam a elucidar a leitura.
‘Os Irmãos Karamázov’ narra a tragédia familiar centrada em torno de um pai, Fiódor Karamázov e seus três filhos: Dmitri, Ivan e Aliócha. Ivan e Aliócha têm a mesma mãe, mas Dmitri, o mais velho, é filho de outra mulher. Os três são muito diferentes entre si, como se pode imaginar, cada um impulsionado por diferentes filosofias ou visões de mundo.
Fiódor é um proprietário de terras ganancioso, libertino, obsceno e um pai negligente. Assim sendo, seus filhos acabam se tornando jovens sob os cuidados de várias outras pessoas. Em dado momento, todos voltam para casa para visitar o pai e é a primeira vez que estão juntos há algum tempo.
O último e provavelmente um dos maiores romances de Dostoiévski, ‘Os Irmãos Karamázov’ (1879-80) concentra-se em seus temas teológicos e filosóficos favoritos: a origem do mal, a natureza da liberdade e o desejo de fé. Um pai perdulário e perverso que zomba de tudo que é nobre e se envolve em todo tipo de conflito em todas as oportunidades. Quando seus filhos eram crianças, ele os negligenciou não por maldade, mas simplesmente porque os “esqueceu”.
O mais velho, Dmitri, tem um temperamento bipolar. Personalidade mais parecida com a do pai, um homem arrogante, violento e passional, que acaba brigando com seu pai por dinheiro e compete com ele pela mesma mulher, Grushenka.
Quando Fiódor é assassinado, evidências circunstanciais levam à prisão e condenação de Dmitri pelo crime, que na verdade foi cometido pelo quarto e não reconhecido filho, o malicioso e epilético Smerdyakov, que acaba se matando por não saber lidar com o próprio crime.
O irmão do meio, Ivan, é um intelectual arrogante, extremamente cético e atormentado pelos dilemas de sua erudição. O personagem é afligido por traumas e conflitos internos. Acredito que um dos personagens mais complexos da trama.
Já o caçula, Alexsei — ou Aliócha, como é chamado pelos irmãos —, reúne em si todas as virtudes que os outros não têm: honesto e humilde, vive como noviço em um mosteiro de monges ortodoxos. Aliócha é o filho preferido, o irmão preferido pelos demais, o elo entre todos eles. Seguindo o sábio monge Zossima, Aliósha tenta colocar em prática o amor cristão.
“Os Irmãos Karamázov” aborda alguns temas bastante complexos. Assim como Raskolnikov, em “Crime e castigo”, Ivan argumenta que, se não há Deus nem imortalidade da alma, então “tudo é permitido”. Segundo ele, mesmo que nem tudo seja permitido, a pessoa é responsável apenas por suas ações, mas não por seus desejos. Ainda assim, quando o velho Karamázov é assassinado, Ivan, apesar de todas as suas teorias, passa a se sentir culpado por ter desejado a morte de seu pai.
Ao traçar a dinâmica da culpa de Ivan, Dostoiévski de fato fornece uma justificativa psicológica para o ensinamento cristão: o mal acontece não apenas por causa de alguns criminosos, mas por causa de um clima moral no qual todas as pessoas participam alimentando desejos malignos. Portanto, como ensina o padre Zossima, “todos são responsáveis por todos e por tudo”.
A intensidade e a contradição de seus personagens transformaram Dostoiévski em sinônimo de profundidade psicológica. O autor lidou de forma magistral com grandes temas da política e da religião, e as profundas questões existenciais sobre fé e sofrimento.
Fiódor Dostoiévski morreu em 9 de fevereiro de 1881 (59 anos) em São Petersburgo, vítima de epilepsia
FICHA TÉCNICA
ASIN: 8573264098
Editora: Editora 34; 3ª edição (1 janeiro 2012)
Idioma: Português
Capa comum: 1040 páginas
ISBN-10: 9788573264098
ISBN-13: 978-8573264098
Dimensões: 23.6 x 16.4 x 5.4 cm
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2 Comentários
Excelente post. Esse livro está no meu radar. Tenho me aventurado em autores russos e a lista de desejos não para de crescer. Lerei País e filhos (Ivan Turgueniev) este ano.
Adorei a maneira enxuta do artigo. Deve ter sido difícil escrever sobre algo tão complexo como um livro de Dostoiévsky de forma tão compacta, você fez isso com grande maestria. Nunca li esse livro, seu artigo atiçou minha curiosidade.