A liberdade de imprensa e de expressão, prevista em lei, nem sempre é respeitada pelos governantes de plantão.
Antiga fábula indiana narra o caso de seis sábios cegos que nunca tinham visto um elefante. Um belo dia, um forasteiro chega à aldeia dos sábios montado em um elefante, e os sábios foram conduzidos à praça onde estava o animal.
Cegos, os sábios dispuseram-se em volta do elefante para tocá-lo e, pelo tato, percebê-lo e descrevê-lo.
Um dos sábios apalpou a barriga do elefante e disse:
– É um animal gigantesco, pois toco em seus músculos, e ele não se move.
O segundo tocou a presa do elefante e contestou:
– Você está enganado. O animal é pontudo como lança; parece arma de guerra.
O terceiro sábio apertou a tromba do elefante e retrucou:
– Vocês estão errados. Este animal parece uma serpente mansa e macia, que não morde porque não tem dentes na boca.
O quarto sábio tocou as orelhas do elefante e ponderou:
– Vocês estão alucinados. Os movimentos deste animal são ondeantes, e ele se parece com um leque.
Depois de se agarrar à perna do elefante, o quinto sábio discordou dos anteriores:
– O animal é como uma torre fixa e rígida. Ou como o tronco de uma árvore.
O sexto sábio gritou com os demais depois de segurar na cauda do elefante:
– Todos estão errados. Este animal é como uma rocha preso por uma cordinha.
A moral da história é que os seres humanos querem fazer valer a sua opinião, com base em suas experiências limitadas e subjetivas e ainda querem ignorar e desprezar a opinião de terceiros, ainda que a opinião deles seja verdadeira.
Ninguém tem a visão completa dos fatos; todos temos a visão parcial em função de nosso ângulo de observação, de nossa formação e de nosso conhecimento. Ninguém é onisciente.
Tanto assim é que existe testemunha de acusação – que vê o fato sob a ótica que beneficia a vítima – e a testemunha de defesa – que vê o fato sob a ótica que beneficia o réu. Dirão que há necessidade de um juiz para dizer onde está a verdade. Errado; no tribunal do júri quem julga e considera os fatos são os jurados; o juiz apenas ratifica a decisão dos jurados e profere a sentença. Além disso, o juiz considera outras provas – documentais e processuais – e não apenas a declaração de testemunhas.
Portanto, não há juiz dono da verdade e ninguém é dono da verdade porque somos todos humanos e limitados em conhecimento, observação e análise dos fatos.
O mais grave ocorre quando os pretensos donos da verdade são os governantes que querem impor a sua verdade e o seu pensamento e não querem ouvir críticas e nem opiniões contrárias. Exatamente como querem fazer no Brasil de hoje, quando o governo pretende aprovar a lei da “fake news”.
Governantes ditatoriais, arrogantes e prepotentes acreditam que somente eles sabem o que é verdade e que eles são os donos da verdade e acreditam que somos todos idiotas, fracos e incapazes de avaliar os fatos e discernir a verdade. Acreditam que eles, governantes sábios e oniscientes, têm de raciocinar por nós para nos deixar ver apenas o que é a verdade deles e que somente podemos ver e ouvir aquilo que eles aprovarem. Eles são os inteligentes, os donos da verdade, os honestos e puros que devem impor aquilo que podemos dizer e ouvir.
Eles, governantes sábios, puros e deuses, querem impor a verdade deles e ficar em pedestais de modo a não ouvirem críticas e nem deixar correr notícias que os desagradam. Neste caso, a lei se torna menos poderosa que os governantes que a violentam; eles passam a ser os senhores e os donos da verdade.
Governantes que querem restringir a liberdade de expressão têm a presunção de ser oniscientes e onipresentes, que tudo sabem, tudo veem, tudo podem e, como deuses, não podem ser contestados e nem criticados. Podem me impedir de dizer o que penso e sinto. Podem até retirar de todos a possibilidade de lutar, de aprender e conhecer os fatos, porque retiram de todos nós as armas da informação e a livre circulação de ideias.
Pela lei de fake news, os sábios cegos da fábula seriam condenados por espalharem notícias falsas sobre o elefante.
2 Comentários
👋👋👋👋👋👋
Excelente texto!
Não sabem nada, são, apenas uns covardes.
Jamais conseguirão esconder as verdades com suas artimanhas, a tecnologia não irá permitir. Até os cegos vão ficar sabendo.